O Presidente da República sancionou no último dia 12 a Lei 14.811/2024, que tem como objetivo garantir a proteção de crianças e adolescentes em estabelecimentos educacionais ou similares. Dentre as medidas da lei nova, destacam-se algumas alterações importantes no Código Penal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei de Crimes Hediondos.
O primeiro ponto importante foi a criação dos crimes de intimidação sistemática e intimidação sistemática virtual, eles buscam conter o bullying e cyberbullying, respectivamente. O primeiro com pena de multa e o segundo com pena de reclusão que varia de 2 a 4 anos, salvo se constituir crime mais grave.
Salta aos olhos, todavia, a redação problemática da lei, que demanda para a ocorrência do crime que ele tenha ocorrido sem motivação evidente. Discriminar, subjugar, fragilizar uma criança ou um adolescente, são todos motivações comuns do bullying ou cyberbullying, o que afastaria a ocorrência do crime em qualquer hipótese que não essas — não é possível imaginar esses tipos penais sem essa motivações.
Em outras palavras, seria como definirmos como furto “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel, sem motivação evidente“. A motivação do furto sempre é evidente: apropriar-se de algo que não é seu com objetivo de ampliar seu patrimônio!
Outra mudança foi a inclusão de uma causa de aumento da pena para o homicídio, que passa a ser aumentada em 2/3 caso o crime seja praticado em instituição de educação básica pública ou privada — uma clara resposta às ondas de agressões em escolas, que assolaram o Brasil em 2023.
Já o induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação passa a ter a pena dobrada se o autor é líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou é responsável por estes.
Novos crimes considerados hediondos
A liste dos crimes hediondos também sofreu alteração, foi ampliada com a adição dos crimes de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação realizados por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitidos em tempo real (art. 122, caput e § 4º do Código Penal), sequestro e cárcere privado cometido contra menor de 18 (dezoito) anos (art. 148, § 1º, inciso IV do Código Penal), tráfico de pessoas cometido contra criança ou adolescente (art. 149-A, caput, incisos I a V, e § 1º, inciso II do Código Penal).
Mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente
O Estatuto da Criança e do Adolescente passou por algumas modificações. Passaram a ser considerados hediondos, são os previstos no artigo 240, §1º:
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem:
I – agencia, facilita, recruta, coage ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena;
II – exibe, transmite, auxilia ou facilita a exibição ou transmissão, em tempo real, pela internet, por aplicativos, por meio de dispositivo informático ou qualquer meio ou ambiente digital, de cena de sexo explícito ou pornográfica com a participação de criança ou adolescente.
Fato curioso é que quem registra cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, não comete crime hediondo, quem exibe a gravação, sim. Caso o registro se dê com a transmissão em tempo real, a conduta será a hedionda, do artigo 240, §1º, inciso II. Caso seja posteriormente transmitido, mas não em tempo real, será a conduta do artigo 241-A, caput, que também não é hedionda.
Ainda, o crime previsto no caput do artigo 241-B do ECA também se tornou hediondo. Ele descreve que é crime “adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”.
Por fim, há outro crime novo no ECA, que busca endereçar o desaparecimento de crianças que não é comunicado pelos pais: “Deixar o pai, a mãe ou o responsável legal, de forma dolosa, de comunicar à autoridade pública o desaparecimento de criança ou adolescente”.
Como se vê, inúmeras alterações vieram com a lei nova. A compreensão da lei e de efetividade na proteção integral de crianças e adolescentes só será possível com estudos aprofundados.
Imagem de Greg Rosenke em Unsplash